segunda-feira, 21 de maio de 2018

Formação territorial do Brasil (1) - franceses, espanhóis e holandeses


Disputas territoriais europeias no Brasil
A competição entre os reinos europeus, mostrou reflexos diretos nas regiões coloniais na América. No caso particular dos territórios que resultaram na formação do Brasil, temos vários destaques a serem feitos.
1) Franceses no Brasil
As incursões francesas no litoral brasileiro foram realizadas com exploração extrativista florestal (principalmente pau brasil), fundação de colônias e de cidades e corso (ataque e saque a cidades e embarcações)
Para facilitar a compreensão, vamos dividir o estudo de franceses no Brasil em três partes.
(a) Litoral Norte – Nordeste (lutas entre portugueses e franceses)
A situação que destacamos aqui se aplica à longa linha litorânea que se estende da Paraíba à foz do Rio Amazonas. A exploração extrativista, realizada por franceses, antecedeu a ocupação portuguesa nessa região.
Para evitar que esse território fosse definitivamente dominado pelos franceses, foi criado um plano de conquista militar e ocupação gradual. A capitania de Pernambuco foi a base de expansão, já que era a área sob domínio português mais ao norte, nesta época.

Os franceses, mesmo quando não faziam ocupação regular de uma área, tinham boa relação de amizade com algum grupo indígena.
A partir de 1580, quando começou a fase da União Ibérica (veremos mais à frente), as forças que lutaram contra os franceses eram luso-espanholas. Sempre seduzindo a algum grupo indígena para que os apoiasse contra os franceses aliados a outros índios.
Após os conflitos armados uma fortificação militar era construída, em seguida sesmarias eram distribuídas e uma cidade surgia em consequência dessas atitudes.
Forte dos Reis Magos (a cidade de Natal ao fundo)
Assim surgiu Felipeia de Nossa senhora das Neves (atual João Pessoa), na ocupação da Paraíba, Natal, na ocupação do Rio grande do Norte, Fortaleza, na ocupação do Ceará e Belém, na ocupação da região da Foz do rio Amazonas.

No Maranhão aconteceu um pouco diferente. Em 1612 foi fundada a França Equinocial, com a cidade de São Luís. As lutas das forças luso-espanholas foram prolongadas e mais difíceis. Terminaram apenas em 1614. O líder das forças de ocupação, Jerônimo de Albuquerque, manteve a cidade iniciada pelos franceses.
(b) Franceses no Rio de Janeiro – França Antárctica
A baía da Guanabara, confundida inicialmente com a foz de um grande rio, por longo tempo foi chamada de baía do Rio de Janeiro após descobrirem o engano. Por causa da baía, o território que a circunda ficou conhecido como Rio de Janeiro.
Um grupo de colonos franceses, liderados por Nicolau Villegagnon, planejaram fundar uma colônia onde não ocorressem as lutas religiosas bastante comuns na França daquela época (católicos X calvinistas huguenotes). A colônia chamada de França Antárctica foi criada em 1555, na baía do Rio de Janeiro.
A reação do governador geral Mém de Sá, que atacou os franceses, foi insuficiente. De Lisboa chegaram reforços comandados pelo capitão português, Estácio de Sá, que foram ampliados com a adesão de voluntários da Bahia, Pernambuco, Espírito Santo (índios termininós do cacique Arariboia) e de São Vicente.
As forças portuguesas se fortificaram entre os morros Cara de Cão e da Urca (área correspondente aos atuais bairros de Botafogo e Urca).
Estácio morreu em consequência de um ferimento. O governador geral retornou à área de conflito com novos reforços. As lutas só terminaram em 1567, quando os franceses se retiraram, derrotados, da região.
Da vitória portuguesa resultou a fundação da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro que, com o tempo ficou com a denominação preferencial de Cidade do Rio de Janeiro.

(c) Franceses no Rio de Janeiro – corsários
Em 1710 o fracassado ataque do corsário Jean Duclèrc fez um desastrado ataque ao Rio de Janeiro. Derrotado e preso, morreu meses depois, em circunstâncias obscuras, na cidade.
No ano seguinte, 1711, outro corsário francês, René Duguay-Trouin, atacou e dominou a cidade. Saiu daqui com um valiosíssimo resgate em ouro, açúcar e gado.
 
2) União Ibérica (1580 – 1640)
Com a morte do jovem rei de Portugal, D. Sebastião, sem deixar herdeiros, o trono foi ocupado por seu tio, o bispo D. Henrique, que morreu idoso. Abriu-se uma questão dinástica (disputa pelo trono). Um parente distante, D. Felipe, que era o rei da Espanha, conseguiu se fazer rei de Portugal em 1580.
No acordo feito entre D. Felipe e a nobreza portuguesa a administração dos interesses do Estado, da nobreza e da burguesia portuguesa continuaria a ser realizada por portugueses. Dessa forma, não deveria haver união de fato. Apenas uma pessoa que, simultaneamente, seria rei de dois reinos diferentes.    
Nessa época o poder do rei D. Felipe na Europa, abrangia Espanha, Portugal, Reino dos Países Baixos e Reino de Nápoles. Os domínios pelo mundo somaram as áreas controladas pelos espanhóis e pelos portugueses (veja mapa). Naturalmente os limites estabelecidos pelos tratados de Tordesilhas (no Ocidente) e de Saragoça (Oriente), entre Espanha e Portugal, perderam a importância.
Nessa época, um conjunto de leis e regras criadas por D. Felipe teve muita importância na formação histórica do Brasil: Ordenações Filipinas.
Na Europa D. Felipe enfrentou dificuldades com a rebelião de uma parte do Reino dos Países Baixos, que se tornou independente com o nome de República das Províncias Unidas (Holanda atual). Essa região era liderada por comerciantes, insatisfeitos com a interferência do rei no comércio, e predominantemente protestante calvinista (que sofria perseguições por parte dos espanhóis, que eram católicos).
Um longo conflito entre espanhóis e holandeses se iniciou nessa fase. Todos os domínios do rei D. Felipe no mundo passaram a ser alvo dos ataques holandeses.
Foram criadas duas empresas, por comerciantes holandeses, com objetivo de praticar comércio e corso: a Companhia das Índias Orientais e a Companhia das Índias Ocidentais (especialmente para atuar na América).
3) Holandeses no Brasil – guerra do açúcar
(a) Origens do conflito
Entre o final do século XV e início do século XVI aconteceu forte perseguição aos judeus, em Portugal. Uma parte deles foi convertida ao catolicismo, essas pessoas eram chamadas de Cristãos Novos (veja detalhes no Link https://brasilescola.uol.com.br/historiag/cristaos-novos.htm), o que não os livrou de perseguição. Outra parte dos cristãos fugiu de Portugal. A maioria direcionou-se ao Reino dos Países Baixos, onde a intolerância religiosa era mais branda naquele momento.
Os judeus portugueses e seus descendentes que residiam nos Países Baixos mantiveram interesses comerciais em Portugal. Eles foram a ligação entre banqueiros e comerciantes holandeses e a implantação da agromanufatura açucareira no Brasil.
A importância da participação holandesa foi decisiva. A maior parte do capital investido na produção de açúcar era holandês. Com o desenvolvimento da economia açucareira brasileira, a participação holandesa ampliou-se. Além dos financiamentos, passou a fazer transporte, refino e distribuição na Europa. Por causa dessa realidade, os holandeses passaram a ficar com a maior parte da lucratividade do açúcar brasileiro.

Distribuição dos lucros do açúcar
Senhores de Engenho – 5 %
Portugueses – 25 %
Holandeses – 70 %

Por ocasião da União Ibérica, o rei D. Felipe proibiu a participação dos inimigos, os holandeses, na economia açucareira do Brasil, pois passou a ser seu território.
Os holandeses da Companhia das Índias Ocidentais passaram a planejar o domínio total da área produtora de açúcar, no Brasil.
(b) Holandeses na Bahia (1624)
O plano era dominar a capital da colônia, Salvador, e ampliar o controle por todas as regiões açucareiras.
O ataque holandês chegou em um momento politicamente confuso em Salvador, o que facilitou a vitória dos invasores. Porém, a resistência de um grupo de guerrilheiros impediu que o domínio fosse completo. D. Felipe enviou uma grande esquadra (Jornada dos Vassalos – ver link https://oglobo.globo.com/brasil/historia-espanha-ja-venceu-holanda-em-salvador-12841041) que expulsou os holandeses da Bahia.
A Companhia das Índias Ocidentais ficou em dificuldades financeiras após a derrotada invasão à Bahia. Foi salva por um golpe de sorte. O Galeão da Prata  foi capturado por um corsário da Companhia, quando navegava no Mar do Caribe.(galeão - Mar. Navio a vela de quatro mastros e popa arredondada, ora bem armado para a guerra, ora usado no transporte de cargas valiosas, do séc. XVI ao XVIII – Dicionário Aulete Digital)
O capital conseguido com essa enorme quantidade de prata foi usado para saldar as dívidas e organizar um novo ataque ao Brasil.


(c) Holandeses em Pernambuco (1630 – 1654)
A escolha de Pernambuco para a realização do segundo ataque ao Brasil resulta de motivos principais: era a região de maior produção de açúcar e a defesa era muito mais frágil do que a da Bahia.
Mesmo após o domínio holandês à Olinda, que era a capital de Pernambuco, os holandeses não conseguiam domínio completo, muito menos expansão que controlasse as áreas produtoras de açúcar. A resistência guerrilheira, liderada pelo governador Mathias de Albuquerque, estava centrada em um ponto do interior chamado de Arraial do Bom Jesus ( ver link http://www.brasilarqueologico.com.br/arqueologia-arraial-velho-bom-jesus.php).
Mathias de Albuquerque e seus combatentes foram derrotados quando um brasileiro chamado Domingos Fernandes Calabar, conhecedor dos planos e táticas da guerrilha, passou para o lado dos holandeses. Devido a isso, o nome Calabar é usado como sinônimo de traidor (a justiça dessa relação é bastante discutível). – Ver detalhes no link https://www.ebiografia.com/domingos_fernandes_calabar/ .
Os domínios holandeses foram ampliados e a Companhia das Índias Ocidentais enviou um administrador competente para atuar como governador. Foi um alemão chamado Maurício de Nassau (ver o link https://educacao.uol.com.br/biografias/mauricio-de-nassau.htm).


A época do governo de Maurício de Nassau foi muito dinâmica e com muitas realizações importantes:
Maurício de Nassau
- financiou a reconstrução de vários engenhos e a ampliação de outros.
- deu espaço para senhores de engenho na Câmara dos Escabinos (espécie de câmara municipal).
- tentou reprimir as perseguições religiosas dos calvinistas holandeses contra os católicos locais.
- urbanizou o povoado do Recife e transformou em capital do Brasil-holandês (Cidade Maurícia ou Moritz Staden).
- Trouxe sábios, pesquisadores e artistas europeus para atuarem no Brasil.
- Criou o primeiro observatório astronômico do continente americano.
- conseguiu o máximo da expansão territorial do domínio holandês no Brasil, de Alagoas ao Maranhão.
 
Franz Post

Albert Eckhout

4) Fim do domínio holandês no Brasil
A Restauração foi o movimento político que conseguiu acabar com a União Ibérica (1640). Portugal voltou a ter governo próprio com o rei D. João IV, que iniciou a Dinastia de Bragança.
Houve lutas contra os espanhóis. Por isso, os portugueses se aliaram aos holandeses, pois estes eram inimigos dos espanhóis.
Devido a aliança com a Holanda, os portugueses tiveram que aceitar o domínio holandês de uma parte do Brasil.
Em 1652 começou uma guerra entre Holanda e Inglaterra. Foi uma reação holandesa a decretação dos Atos de Navegação, por Oliver Cromwell (ver link https://www.infoescola.com/historia/ato-de-navegacao/).
Em consequência da guerra na Europa, os holandeses enfraqueceram a sua presença militar no Brasil. Isso animou aos portugueses a estimular um movimento de rebelião, no Brasil, contra o domínio holandês.
Muitos latifundiários ficaram insatisfeitos, principalmente depois da saída de Maurício de Nassau do Brasil. Os empréstimos passaram a ser cobrados, com rigor, em época de crise na economia da região. Além das perseguições religiosas terem ficado mais graves.
Surgiu a chamada Insurreição Pernambucana que, depois de longo conflito, conseguiu expulsar os holandeses do Nordeste. (ver link https://brasilescola.uol.com.br/historiab/insurreicao-pernambucana-1645-1654.htm)  
Podemos destacar duas consequências mais importantes da expulsão dos holandeses:
- Perdas portuguesas – os holandeses reclamaram que os portugueses desrespeitaram o acordo de paz, que confirmava o domínio sobre o nordeste do Brasil. Exigiram de Portugal uma indenização em dinheiro e compensações territoriais. O governo português aceitou pagar e entregou a maior parte da indonésia para os holandeses (ficou apenas com o Timor Leste).
- Decadência econômica – depois de saírem do Brasil, os holandeses passaram a investir mais ne produção de açúcar em algumas ilhas do Mar do Caribe. Com métodos agrícolas melhores e menor preço do frete para exportar para a Europa (a distância é menor), o açúcar antilhano era vendido por preço mais baixo. Os portugueses tiveram que diminuir a margem de lucro para manter a concorrência. A consequência foi o longo processo de empobrecimento da região açucareira do Nordeste Brasileiro.