Disputas territoriais
europeias no Brasil
A competição entre os reinos europeus, mostrou reflexos
diretos nas regiões coloniais na América. No caso particular dos territórios
que resultaram na formação do Brasil, temos vários destaques a serem feitos.
1) Franceses no
Brasil
As incursões francesas no litoral brasileiro foram
realizadas com exploração extrativista florestal (principalmente pau brasil),
fundação de colônias e de cidades e corso (ataque e saque a cidades e embarcações)
Para facilitar a compreensão, vamos dividir o estudo de
franceses no Brasil em três partes.
(a) Litoral Norte –
Nordeste (lutas entre portugueses e franceses)
A situação que destacamos aqui se aplica à longa linha
litorânea que se estende da Paraíba à foz do Rio Amazonas. A exploração
extrativista, realizada por franceses, antecedeu a ocupação portuguesa nessa
região.
Para evitar que esse território fosse definitivamente
dominado pelos franceses, foi criado um plano de conquista militar e ocupação
gradual. A capitania de Pernambuco foi a base de expansão, já que era a área
sob domínio português mais ao norte, nesta época.
Os franceses, mesmo quando não faziam ocupação regular de
uma área, tinham boa relação de amizade com algum grupo indígena.
A partir de 1580, quando começou a fase da União Ibérica (veremos
mais à frente), as forças que lutaram contra os franceses eram luso-espanholas.
Sempre seduzindo a algum grupo indígena para que os apoiasse contra os
franceses aliados a outros índios.
Após os conflitos armados uma fortificação militar era
construída, em seguida sesmarias eram distribuídas e uma cidade surgia em
consequência dessas atitudes.
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Forte dos Reis Magos (a cidade de Natal ao fundo)
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Assim surgiu Felipeia de Nossa senhora das Neves (atual João
Pessoa), na ocupação da Paraíba, Natal, na ocupação do Rio grande do Norte,
Fortaleza, na ocupação do Ceará e Belém, na ocupação da região da Foz do rio
Amazonas.
No Maranhão aconteceu um pouco diferente. Em 1612 foi
fundada a França Equinocial, com a cidade de São Luís. As lutas das forças luso-espanholas
foram prolongadas e mais difíceis. Terminaram apenas em 1614. O líder das
forças de ocupação, Jerônimo de Albuquerque, manteve a cidade iniciada pelos
franceses.
(b) Franceses no Rio
de Janeiro – França Antárctica

Um grupo de colonos franceses, liderados por Nicolau
Villegagnon, planejaram fundar uma colônia onde não ocorressem as lutas
religiosas bastante comuns na França daquela época (católicos X calvinistas
huguenotes). A colônia chamada de França Antárctica foi criada em 1555, na baía
do Rio de Janeiro.
A reação do governador geral Mém de Sá, que atacou os
franceses, foi insuficiente. De Lisboa chegaram reforços comandados pelo
capitão português, Estácio de Sá, que foram ampliados com a adesão de
voluntários da Bahia, Pernambuco, Espírito Santo (índios termininós do cacique
Arariboia) e de São Vicente.
As forças portuguesas se fortificaram entre os morros Cara
de Cão e da Urca (área correspondente aos atuais bairros de Botafogo e Urca).
Estácio morreu em consequência de um ferimento. O governador
geral retornou à área de conflito com novos reforços. As lutas só terminaram em
1567, quando os franceses se retiraram, derrotados, da região.
Da vitória portuguesa resultou a fundação da Cidade de São
Sebastião do Rio de Janeiro que, com o tempo ficou com a denominação
preferencial de Cidade do Rio de Janeiro.
(c) Franceses no Rio
de Janeiro – corsários
Em 1710 o fracassado ataque do corsário Jean Duclèrc fez um
desastrado ataque ao Rio de Janeiro. Derrotado e preso, morreu meses depois, em
circunstâncias obscuras, na cidade.
No ano seguinte, 1711, outro corsário francês, René
Duguay-Trouin, atacou e dominou a cidade. Saiu daqui com um valiosíssimo
resgate em ouro, açúcar e gado.
2) União Ibérica
(1580 – 1640)
Com a morte do jovem rei de Portugal, D. Sebastião, sem
deixar herdeiros, o trono foi ocupado por seu tio, o bispo D. Henrique, que
morreu idoso. Abriu-se uma questão dinástica (disputa pelo trono). Um parente
distante, D. Felipe, que era o rei da Espanha, conseguiu se fazer rei de
Portugal em 1580.
No acordo feito entre
D. Felipe e a nobreza portuguesa a administração dos interesses do Estado, da
nobreza e da burguesia portuguesa continuaria a ser realizada por portugueses.
Dessa forma, não deveria haver união de fato. Apenas uma pessoa que,
simultaneamente, seria rei de dois reinos diferentes.
Nessa época o poder do rei D. Felipe na Europa, abrangia
Espanha, Portugal, Reino dos Países Baixos e Reino de Nápoles. Os domínios pelo
mundo somaram as áreas controladas pelos espanhóis e pelos portugueses (veja
mapa). Naturalmente os limites estabelecidos pelos tratados de Tordesilhas (no Ocidente) e de Saragoça (Oriente), entre Espanha e Portugal, perderam a
importância.
Nessa época, um conjunto de leis e regras criadas por D.
Felipe teve muita importância na formação histórica do Brasil: Ordenações Filipinas.
Na Europa D. Felipe enfrentou dificuldades com a rebelião de
uma parte do Reino dos Países Baixos, que se tornou independente com o nome de
República das Províncias Unidas (Holanda atual). Essa região era liderada por
comerciantes, insatisfeitos com a interferência do rei no comércio, e
predominantemente protestante calvinista (que sofria perseguições por parte dos
espanhóis, que eram católicos).
Um longo conflito entre espanhóis e holandeses se iniciou
nessa fase. Todos os domínios do rei D. Felipe no mundo passaram a ser alvo dos
ataques holandeses.
Foram criadas duas empresas, por comerciantes holandeses,
com objetivo de praticar comércio e corso: a Companhia das Índias Orientais e a
Companhia das Índias Ocidentais (especialmente para atuar na América).
3) Holandeses no
Brasil – guerra do açúcar
(a) Origens do
conflito
Entre o final do século XV e início do século XVI aconteceu
forte perseguição aos judeus, em Portugal. Uma parte deles foi convertida ao
catolicismo, essas pessoas eram chamadas de Cristãos Novos (veja detalhes no
Link https://brasilescola.uol.com.br/historiag/cristaos-novos.htm),
o que não os livrou de perseguição. Outra parte dos cristãos fugiu de Portugal.
A maioria direcionou-se ao Reino dos Países Baixos, onde a intolerância
religiosa era mais branda naquele momento.
Os judeus portugueses e seus descendentes que residiam nos
Países Baixos mantiveram interesses comerciais em Portugal. Eles foram a ligação
entre banqueiros e comerciantes holandeses e a implantação da agromanufatura
açucareira no Brasil.
A importância da participação holandesa foi decisiva. A
maior parte do capital investido na produção de açúcar era holandês. Com o
desenvolvimento da economia açucareira brasileira, a participação holandesa
ampliou-se. Além dos financiamentos, passou a fazer transporte, refino e
distribuição na Europa. Por causa dessa realidade, os holandeses passaram a
ficar com a maior parte da lucratividade do açúcar brasileiro.
Por ocasião da União Ibérica, o rei D. Felipe proibiu a participação dos inimigos, os holandeses, na economia açucareira do Brasil, pois passou a ser seu território.
Distribuição dos lucros do açúcar
Senhores de Engenho – 5 %
Portugueses – 25 %
Holandeses – 70 %
Por ocasião da União Ibérica, o rei D. Felipe proibiu a participação dos inimigos, os holandeses, na economia açucareira do Brasil, pois passou a ser seu território.
Os holandeses da Companhia das Índias Ocidentais passaram a
planejar o domínio total da área produtora de açúcar, no Brasil.
(b) Holandeses na
Bahia (1624)
O plano era dominar a capital da colônia, Salvador, e
ampliar o controle por todas as regiões açucareiras.
O ataque holandês chegou em um momento politicamente confuso
em Salvador, o que facilitou a vitória dos invasores. Porém, a resistência de
um grupo de guerrilheiros impediu que o domínio fosse completo. D. Felipe
enviou uma grande esquadra (Jornada dos Vassalos – ver link https://oglobo.globo.com/brasil/historia-espanha-ja-venceu-holanda-em-salvador-12841041)
que expulsou os holandeses da Bahia.
A Companhia das Índias Ocidentais ficou em dificuldades
financeiras após a derrotada invasão à Bahia. Foi salva por um golpe de sorte.
O Galeão da Prata foi capturado
por um corsário da Companhia, quando navegava no Mar do Caribe.(galeão - Mar. Navio a vela de quatro mastros e popa arredondada, ora bem
armado para a guerra, ora usado no transporte de cargas valiosas, do séc. XVI
ao XVIII – Dicionário Aulete Digital)
O capital conseguido com essa enorme quantidade de prata foi
usado para saldar as dívidas e organizar um novo ataque ao Brasil.
(c) Holandeses em
Pernambuco (1630 – 1654)
A escolha de Pernambuco para a realização do segundo ataque
ao Brasil resulta de motivos principais: era a região de maior produção de
açúcar e a defesa era muito mais frágil do que a da Bahia.
Mesmo após o domínio holandês à Olinda, que era a capital de
Pernambuco, os holandeses não conseguiam domínio completo, muito menos expansão
que controlasse as áreas produtoras de açúcar. A resistência guerrilheira,
liderada pelo governador Mathias de Albuquerque, estava centrada em um ponto do
interior chamado de Arraial do Bom Jesus ( ver link http://www.brasilarqueologico.com.br/arqueologia-arraial-velho-bom-jesus.php).
Mathias de Albuquerque e seus combatentes foram derrotados
quando um brasileiro chamado Domingos Fernandes Calabar, conhecedor dos
planos e táticas da guerrilha, passou para o lado dos holandeses. Devido a
isso, o nome Calabar é usado como sinônimo de traidor (a justiça dessa relação
é bastante discutível). – Ver detalhes no link https://www.ebiografia.com/domingos_fernandes_calabar/
.
Os domínios holandeses foram ampliados e a Companhia das
Índias Ocidentais enviou um administrador competente para atuar como governador.
Foi um alemão chamado Maurício de Nassau (ver o link https://educacao.uol.com.br/biografias/mauricio-de-nassau.htm).
A época do governo de Maurício de
Nassau foi muito dinâmica e com muitas realizações importantes:
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Maurício de Nassau |
- financiou a reconstrução de vários engenhos
e a ampliação de outros.
- deu espaço para senhores de engenho
na Câmara dos Escabinos (espécie de câmara municipal).
- tentou reprimir as perseguições religiosas
dos calvinistas holandeses contra os católicos locais.
- urbanizou o povoado do Recife e
transformou em capital do Brasil-holandês (Cidade Maurícia ou Moritz Staden).
- Trouxe sábios, pesquisadores e
artistas europeus para atuarem no Brasil.
- Criou o primeiro observatório
astronômico do continente americano.
- conseguiu o máximo da expansão
territorial do domínio holandês no Brasil, de Alagoas ao Maranhão.
![]() |
Franz Post |
![]() |
Albert
Eckhout
|
4) Fim do domínio holandês no Brasil
A Restauração foi o movimento
político que conseguiu acabar com a União Ibérica (1640). Portugal voltou a ter
governo próprio com o rei D. João IV, que iniciou a Dinastia de Bragança.
Houve lutas contra os espanhóis.
Por isso, os portugueses se aliaram aos holandeses, pois estes eram inimigos
dos espanhóis.
Devido a aliança com a Holanda, os
portugueses tiveram que aceitar o domínio holandês de uma parte do Brasil.
Em 1652 começou uma guerra entre
Holanda e Inglaterra. Foi uma reação holandesa a decretação dos Atos de
Navegação, por Oliver Cromwell (ver link https://www.infoescola.com/historia/ato-de-navegacao/).
Em consequência da guerra na
Europa, os holandeses enfraqueceram a sua presença militar no Brasil. Isso
animou aos portugueses a estimular um movimento de rebelião, no Brasil, contra
o domínio holandês.
Muitos latifundiários ficaram insatisfeitos,
principalmente depois da saída de Maurício de Nassau do Brasil. Os empréstimos
passaram a ser cobrados, com rigor, em época de crise na economia da região. Além
das perseguições religiosas terem ficado mais graves.
Surgiu a chamada Insurreição
Pernambucana que, depois de longo conflito, conseguiu expulsar os
holandeses do Nordeste. (ver link https://brasilescola.uol.com.br/historiab/insurreicao-pernambucana-1645-1654.htm)
Podemos destacar duas consequências
mais importantes da expulsão dos holandeses:
- Perdas portuguesas – os holandeses reclamaram que os
portugueses desrespeitaram o acordo de paz, que confirmava o domínio sobre o
nordeste do Brasil. Exigiram de Portugal uma indenização em dinheiro e
compensações territoriais. O governo português aceitou pagar e entregou a maior
parte da indonésia para os holandeses (ficou apenas com o Timor Leste).
- Decadência econômica – depois de saírem do Brasil, os holandeses
passaram a investir mais ne produção de açúcar em algumas ilhas do Mar do
Caribe. Com métodos agrícolas melhores e menor preço do frete para exportar para
a Europa (a distância é menor), o açúcar antilhano era vendido por preço mais
baixo. Os portugueses tiveram que diminuir a margem de lucro para manter a
concorrência. A consequência foi o longo processo de empobrecimento da região
açucareira do Nordeste Brasileiro.